Senhor João
No meio de quadros de fotos da Suazilândia, Moçambique e África do Sul – paisagens que ele mesmo fotografou, encontramos jornais, revistas, papel de presente, fita, calendário, gomas.
Falando em sorte, há quem só faça apostas na lua nova e na lua cheia, mas há quem as faça diariamente. Duvidas? Já passou na Papelaria Económica do senhor João? Recomendo que passe por lá e faça uma fézinha. Pode ir. Ele abre de domingo a domingo.
A história do seu João começa na Cruz de Pau quando ele já era um rapaz e os pais, Fernando Ribeiro e Alzira Ribeiro, ao voltarem do exterior, em 1984, compraram e assumiram uma papelaria que já vinha de longe. O avô, que morava acima do talho ao lado, foi quem descobriu a oportunidade.
O senhor João nasceu em Moçambique e, depois do 25 de Abril, aos cinco anos, mudou-se com a família para a África do Sul. Quando voltou para Portugal tinha dezasseis anos. A adaptação não foi fácil. Como o avô tinha outra papelaria em Matosinhos, e o jovem passava o dia a trabalhar, nada percebia do Bairro, que na década de 80 era ermo. Só havia a Quinta Seca e uma grande bouça. Ele passou muitos anos a acompanhar o avô, fora do horário escolar.
Falando em escola, chegou a haver uma Telescola no Bairro, acompanhada pelo professor Alves, casado com a professora Alda. Era algo muito moderno para a época. Modernidade e obsolescência… As três máquinas registadoras que o senhor João mantem na papelaria retratam bem essa transição.
Em 2008, quando os pais já estavam mais velhos, João passou a dedicar-se à loja. No meio de quadros de fotos da Suazilândia, Moçambique e África do Sul – paisagens que ele mesmo fotografou, encontramos jornais, revistas, papel de presente, fita, calendário, gomas. Senhor João preza pela diversidade de produtos para que ali o cliente sempre encontre o que procura
“Tenho de tudo um bocadinho – ele diz, cuidadoso.”
Na prateleira, as imagens de Nossa Senhora de Fátima e Santo António convivem amistosamente com as apostas e o tabaco. Dão pistas da sua fé. De facto, ele vai uma vez por ano a Fátima, mas não por promessas, que não gosta disso. Vai mesmo por devoção.
Justo ele que nunca lê os jornais e pouco conhece as histórias do Bairro, tem a porta aberta para que o Bairro saiba das notícias e histórias do mundo. Para ele, na Cruz de Pau não há histórias extraordinárias, vive- se o cotidiano de um bairro familiar, que não oferece problemas para ninguém.
Seu João que sempre joga e não gosta de promessas, tem ao menos uma a cumprir. Disse que se ganhar, faz uma festa! Eu Muro, que presto atenção, acredito!